Algumas das questões mais prementes e controversas da atualidade dizem respeito às drogas. Trata-se de um problema em escala planetária, associado a temas muito sérios de saúde pública, ligado à criminalidade (parte significativa das populações masculinas e femininas dos presídios está relacionada ao tráfico), um comércio bilionário que ameaça a estabilidade de muitos países. No âmbito pessoal, o consumo perfaz um leque que vai do sancionado álcool – desde uma quase inócua taça de vinho ou eventual dose de destilado ao alcoolismo patológico – ao tabaco, maconha, cocaína e drogas sintéticas. Os riscos do consumo descontrolado e da adição não podem ser ignorados, porém raramente o tema é posto em debate sem que posições radicais punitivas, compreensíveis mágoas de vítimas, ou propostas de liberação sem muita consistência, venham ao palco.
Por isso o Projeto Academia UniBrasil julga importante ouvir um especialista no assunto, Mauricio Fiore, coordenador científico da Plataforma Brasileira de Política de Drogas e pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento. O convidará virá ao UniBrasil no próximo 10 de abril às 10h no auditório Cordeiro Clève, para realizar palestra com o tema: “Repensando o lugar do Estado frente às drogas e seus usos”, na qual “tentará equilibrar as questões relativas aos usos (e seus potenciais danos) de drogas e a forma como o Estado trata o tema (política de drogas) ”.
O palestrante é bacharel em Ciências Sociais, mestre em Antropologia Social pela Universidade de São Paulo (USP) e doutor em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). É pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (CEBRAP), coordenador científico da Plataforma Brasileira de Política de Drogas e membro-fundador do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre psicoativos (Neip) e da Associação Brasileira de Estudos Sociais sobre o Uso de Psicoativos (Abesup). Seu principal campo de atuação acadêmica é o dos estudos sobre drogas psicoativas, sob diversos de seus aspectos (socioculturais, médicos, políticos, entre outros). Também atuou em pesquisas e produziu trabalhos sobre uso do tempo livre e práticas culturais, sociabilidade urbana, violência e educação.
Segundo Mauricio, “a guerra mundial contra as drogas – nome pelo qual ficaram conhecidas parte das substâncias psicoativas que alteram a consciência e a percepção – completa, este ano, um século. Ainda que as resoluções da Primeira Conferência Internacional do Ópio de 1912, realizada em Haia, tenham sido praticamente abandonadas nos anos conturbados entre as duas grandes guerras, o modelo ali esboçado foi triunfante. Defendida, patrocinada e sediada pelos Estados Unidos, já sob a coordenação da Organização das Nações Unidades (ONU), a Convenção Única sobre Entorpecentes, de 1961, implantou globalmente o paradigma proibicionista no seu formato atual. Os países signatários da convenção se comprometeram à luta contra o “flagelo das drogas” e, para tanto, a punir quem as produzisse, vendesse ou consumisse. Proibicionismo é uma forma simplificada de classificar o paradigma que rege a atuação dos Estados em relação a determinado conjunto de substâncias. Seus desdobramentos, entretanto, vão muito além das convenções e legislações nacionais. O proibicionismo modulou o entendimento contemporâneo de substâncias psicoativas quando estabeleceu os limites arbitrários para usos de drogas legais/positivas e ilegais/negativas. Entre outras consequências, a própria produção científica terminou entrincheirada, na maior parte das vezes do lado “certo” da batalha, ou seja, na luta contra as drogas. O proibicionismo não esgota o fenômeno contemporâneo das drogas, mas o marca decisivamente”.
Pesquisador renomado, Mauricio é um pensador singular, profundamente interessado no tema, e representa uma das principais vozes na área hoje.
Ouvi-lo será importante para que desenvolvamos nossa própria opinião sobre o tema.
Texto: Wanda Camargo